terça-feira, 12 de agosto de 2014

Patrocinadores relutam em pressionar a Fifa: Escândalos vêm cercados de silêncio corporativo

Por JACK EWING

FRANKFURT - Os patrocinadores se pronunciaram de maneira incomum após as acusações mais recentes de corrupção contra a Fifa, que vieram à tona em junho antes da Copa do Mundo no Brasil.
A Sony exigiu uma investigação de possíveis irregularidades na escolha do Qatar para sediar a Copa do Mundo de 2022. A empresa alemã de moda esportiva Adidas advertiu que "o teor negativo do atual debate público sobre a Fifa não é bom para o futebol nem para a Fifa e seus parceiros". Essas preocupações foram ecoadas por outras empresas, incluindo Coca-Cola, Visa, Hyundai e Budweiser.
Com o fim dos jogos da Copa deste ano, porém, é improvável que os patrocinadores exijam reformas. As corporações parceiras da Fifa têm um longo histórico de manter silêncio diante de controvérsias envolvendo a poderosa Federação Internacional de Futebol, pois há demasiado dinheiro em jogo.
"Esses patrocínios não são baratos", disse Simon Chadwick, da Universidade de Coventry, no Reino Unido. Ele explicou que as empresas gastam até US$ 100 milhões (R$ 227 milhões) pelos direitos de patrocínio e um montante semelhante com o merchandising.
É incomum patrocinadores se pronunciarem quando há acusações de que subornos influenciaram a decisão de realizar a Copa do Mundo em 2022 no Qatar. O país era considerado uma opção improvável devido a seu verão muito quente e à falta de jogadores qatarianos de relevância internacional.
Jan Simon, professor-adjunto da Faculdade de Administração de Empresas Iese na Espanha, disse que os patrocinadores poderiam tirar vantagem da situação assumindo uma posição clara.
"Do ponto de vista de divulgação positiva da marca, essa é uma grande oportunidade para dizer 'Nós somos a empresa que quer a implantação de mudanças'", disse Simon. "Se essas mudanças não ocorrerem, pegaremos nosso dinheiro para colocá-lo em lugares onde essas ideias realmente sejam implementadas."
A federação declarou, por e-mail, que "acaba de passar por um amplo processo de reforma da governança, seguindo os princípios de transparência e tolerância zero com quaisquer irregularidades". No entanto, resta saber se os patrocinadores vão querer mudanças. Nenhum dos patrocinadores da Fifa procurados pela reportagem se dispôs a comentar que ações poderiam empreender para evitar futuros escândalos na Fifa.
Se há um patrocinador que a direção da Fifa ouve é a Adidas. A relação entre a Adidas e a Fifa remonta há décadas e tem sido lucrativa para ambas. Durante a Copa do Mundo no Brasil, todos os jogos começavam com um árbitro tirando uma bola, de uma edição especial da Adidas, de um pedestal. A exposição do produto ajudou a vender 14 milhões de bolas Brazuca.
Jan Runau, porta-voz da Adidas, disse que a empresa está preocupada com as acusações relativas ao Qatar, mas também "muito feliz" com sua parceria com a Fifa. "Quando se pensa na Fifa, é preciso considerar os dois lados da moeda", disse ele. "Por um lado, existem essas alegações que não são boas, mas há também o desenvolvimento da Copa do Mundo." NYT, 12.08.2014.
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quinta-feira, 17 de abril de 2014

O copo meio cheio

Não se deve fechar os olhos ao impacto econômico, às obras aceleradas e à capacitação de milhares de brasileiros que a Copa do Mundo propiciará
A experiência que tive na África do Sul, na operação do estádio de Pretória, e o trabalho à frente do Comitê Organizador Local há quatro anos me levam a afirmar que faremos uma grande Copa do Mundo no Brasil. Sou otimista, sim. Conheço os nossos desafios, assim como a nossa capacidade para enfrentá-los. E tenho noção da dimensão de oportunidades propiciadas pelo evento.
Estudo da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe) que mereceu pouquíssima atenção da mídia mostrou que a Copa das Confederações gerou o equivalente a 303 mil empregos em todo o país e adicionou cerca de R$ 10 bilhões ao PIB --mais, portanto, que os R$ 8 bilhões investidos nos 12 estádios construídos para a Copa do Mundo.
Infelizmente, tal estudo rendeu apenas uma nota curta no "Painel FC", da Folha. Em vez de noticiar os principais números, a coluna criticou o impacto do turismo internacional. Faltou apenas informar o leitor que, historicamente, a Copa das Confederações é um torneio voltado para o público local, atraindo em média 3% de torcedores estrangeiros.
Já na Copa do Mundo, esse número é pelo menos dez vezes maior. A previsão do Ministério do Turismo é de que o evento injete aproximadamente R$ 30 bilhões na economia do Brasil, gerando ainda mais empregos e aumentando a arrecadação de impostos. Estes sim poderão ser investidos em saúde e educação, em benefício da população.
Parece ter virado moda falar mal da Copa do Mundo. Parece, mas não virou. Não para a maioria dos brasileiros. Porque, como mostrou pesquisa do Datafolha publicada em 8 de abril pela Folha, 48% dizem ser a favor da realização da Copa no Brasil contra 41% que se dizem contra.
Em seu editorial "A Copa como ela é" (9/4), a Folha mais uma vez escolheu um dado em detrimento de outro. Optou pelo copo meio vazio, prática utilizada anteriormente e que, por sinal, já mereceu críticas da ombudsman do jornal em artigo publicado em outubro de 2013 ("Arauto das más notícias").
Eu prefiro o copo meio cheio. Na Inglaterra, por exemplo, uma pesquisa feita três meses antes da Olimpíada de Londres mostrava que 53% da população não tinha interesse no evento e 64% dos entrevistados diziam que os jogos trariam mais prejuízos do que benefícios.
Como é normal haver ceticismo antes de grandes eventos, buscamos colocar números em perspectiva e mostrar dados concretos: 11 milhões de pedidos de ingressos, mais de 150 mil inscritos no programa de voluntários e 18 mil jornalistas credenciados --recordes em relação às Copas anteriores.
Problemas na preparação se repetem em vários países, com nuances locais. O próprio presidente da Fifa, Joseph Blatter, lembrou o caso do Mundial da Itália, em 1990, em que os últimos assentos foram instalados na véspera do primeiro jogo.
Somos bons de entrega e temos o sucesso da Copa das Confederações para provar. Vamos cobrar de todos os envolvidos que tudo fique pronto a tempo, até porque temos uma grande responsabilidade nas mãos.
Mas beira a falta de informação fechar os olhos ao outro lado da moeda, que leva em conta o impacto econômico, as obras aceleradas ou antecipadas, os modernos estádios no país do futebol e a capacitação de milhares de brasileiros.
E a imprensa tem um papel fundamental nesse sentido: ser crítica, mas também oferecer à opinião pública a visão global dos impactos positivos que o evento traz.

quarta-feira, 16 de abril de 2014

Choque de responsabilidade no futebol

É preciso acabar com a lei não escrita, mas consentida segundo a qual é permitido fazer negociatas, porque clubes ou federações não têm dono
Ainda que a natureza dos clubes e das federações no Brasil, inclusive a CBF (Confederação Brasileira de Futebol), seja de direito privado, o futebol é um esporte que, invariavelmente, envolve recursos públicos, por meio de patrocínio, financiamento ou mesmo pela relação tributária.
Quando um clube deixa de pagar o INSS e o FGTS e sonega o Imposto de Renda, está cometendo crimes que afetam não só o governo, mas, diretamente, o interesse público.
Na Espanha, 36 clubes estão em regime de concordata. No Brasil, poucos são os que não estão falidos. As receitas aumentaram, é verdade, mas o endividamento subiu 74% nos últimos cinco anos.
Fui presidente do Esporte Clube Bahia entre 1975 e 1979 e, em setembro de 2013, vencemos a primeira eleição direta e democrática da história do bicampeão brasileiro, com 68% de quase 5.000 votos.
Encontrei nesse retorno um cenário de terra arrasada. A dívida do Bahia é de mais de R$ 100 milhões. Os contratos, em sua totalidade, são quase todos lesivos: negociatas e dívidas de um grupo que se apossou de um patrimônio que, longe de ser privado, é público.
São dois períodos distintos da história do Brasil: um, sob as nuvens carregadas da ditadura e os efeitos econômicos do "milagre". Outro, em plena democracia, mas com a economia sufocada pela pior crise do capitalismo mundial desde 1929.
Nesse intervalo, nossa receita cresceu para a casa dos milhões, porém a dívida do clube virou um monstro devorador que nos espreita a cada fim de mês, quando temos que pagar despesas e salários, dívidas trabalhistas, impostos sonegados em anos e anos de gestões temerárias, conduzidas por dirigentes encobertos pelo manto eterno da impunidade.
Nos anos 1970, não tínhamos os direitos da TV, os uniformes não ostentavam uma sopa de logomarcas nem possuíamos arenas multiuso. Vivíamos do borderô dos jogos e de uma ou outra "vaquinha" entre os chamados abnegados.
Hoje, os clubes brasileiros vivem da ilusão. Contratam jogadores e treinadores por cifras milionárias, mas se "esquecem" das obrigações.
Por isso, defendemos a fiscalização pública sobre os clubes, para que essa dívida financeira, que a cada dia se agiganta, não empobreça ainda mais o futebol.
Apoiamos totalmente o movimento Bom Senso Futebol Clube, mas vamos além. É preciso que a má gestão seja punida e os maus administradores responsabilizados, acabando com a lei não escrita, mas consentida segundo a qual é permitido fazer negócios e negociatas, porque os clubes ou as federações não têm dono, é coisa de ninguém.
Fechamos questão, portanto, com o substitutivo apresentado pelo deputado federal Otávio Leite (PSDB-RJ) que institui a Lei de Responsabilidade Fiscal do Esporte, obrigando os clubes a apresentarem certidão negativa de débitos sob risco de rebaixamento, responsabilizando pessoalmente os dirigentes e proibindo o aumento das dívidas, sem perdão nem anistia fiscal.
O maior legado desta Copa do Mundo não é só de engenharia, mas, sobretudo, de mentalidade: o chamado padrão Fifa deve nos deixar como herança a obrigação de instituirmos uma nova ordem para o futebol brasileiro.

quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

Maratonas pelo Mundo I

Quero ser 'maraturista'
Brasileiros, que já viajam para correr maratonas, começam a cruzar fronteiras em busca de provas mais desafiadoras, de até 90 km, em países como a África do Sul; confira 33 pacotes e calendário com 25 corridas ao redor do mundo
GUSTAVO SIMONDE SÃO PAULO
Em 3h42 o administrador Celso Ribas, 61, foi e voltou de leste a oeste em Paris: desceu a avenida Champs- Elysées, passou pelo museu do Louvre, cruzou o bosque de Vincennes, margeou o rio Sena, viu a torre Eiffel, entrou no bosque de Boulogne e retornou ao Arco do Triunfo.

Não a bordo de um ônibus de city tour, mas correndo.
Ribas é só um dos milhares de brasileiros que empreendem viagens para disputar grandes corridas de rua. Só da maratona de Paris, neste ano, participaram 497 brasileiros. Na de Amsterdã, 632 --há cinco anos, eram 90.
Na prova Paris-Versailles, de 16 km (um a mais que a São Silvestre), só não há mais brasileiros do que franceses; os 307 corredores do país neste ano (59 em 2010) formaram um grupo maior até que o de belgas, vizinhos da França.
"Quem corre uma maratona, especialmente pela primeira vez, quer uma prova de trajeto plano, com temperatura amena e estrutura confiável --o que poucas provas no Brasil têm", diz Marcos Paulo Reis, dono da assessoria esportiva MPR, uma das principais de corrida.
Por isso, a maratona de Chicago, uma das mais planas, viu o número de brasileiros subir de 291 em 2009 para 567 neste ano; em Berlim, passamos de 414 para 600 no mesmo período.
Mas não são apenas provas de rua que têm visto um aumento do verde e amarelo em suas fileiras de participantes.
"Com o amadurecimento das corridas, em que o desafio move as pessoas, outras modalidades também têm atraído atletas --aquelas em que o tempo importa menos", diz Mário Sérgio Silva, da assessoria esportiva Run&Fun.
São corridas que cruzam montanhas, feitas sob temperaturas próximas a 0°C ou que se estendem por 90 km.
Duas provas disputadas no frio da Patagônia argentina exemplificam isso.
Na Patagonia Run, não havia brasileiros na primeira edição, em 2010; neste ano, eram 589 --número inferior apenas ao de argentinos; a Meia Maratona do Glaciar, em El Calafate, viu o volume de brasileiros mais do que dobrar entre 2012 e 2013: de 42 para mais de cem pessoas.
A Two Oceans, misto de corrida de aventura, meia maratona (21 km) e ultramaratona (56 km) na África do Sul, viu a presença de brasileiros crescer de um, em 2005, para 195 neste ano. No mesmo país, a ultramaratona Comrades, de 89 km, teve 44 brasileiros na disputa há cinco anos; em 2013, foram 132.
Fonte: Folha, 12.12.13.